Mudanças na legislação do transporte de cargas e as consequências para o agronegócio
Novas regras alteram horários de descanso e definem novas diretrizes para jornadas de trabalho; Vale-Pedágio estabelece que embarcadores são responsáveis pelo pagamento antecipado do frete |
É sabido que o transporte via terrestre representa mais da metade do escoamento de grãos no Brasil. Somente nesta safra 23/24, devem ser colhidas 317,5 milhões de toneladas de soja, segundo a Conab, que passarão pelas estradas brasileiras. Mas a principal fonte de escoamento da safra brasileira tem sido motivo de discussão no Supremo Tribunal Federal (STF). A suprema corte estabeleceu recentemente novos critérios para a Lei nº 13.103/15, popularmente chamada de Lei dos Caminhoneiros. As mudanças focam principalmente nas jornadas de trabalho e altera a rotina dos caminhoneiros. Ao todo, 11 pontos da lei foram reformulados, entre eles a jornada de trabalho, pausas para descanso e repouso semanal, itens que, antes da mudança, foram declarados inconstitucionais pelo STF. As novas diretrizes consistem na parada obrigatória na condução do veículo estabelecida pela Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997 - Código de Trânsito Brasileiro, garantidos o mínimo de oito horas ininterruptas no primeiro período e o benefício do remanescente, dentro das dezesseis horas seguintes ao fim do primeiro período. Antes da declaração de inconstitucionalidade pela suprema corte, o motorista tinha a possibilidade de fracionar três horas ao longo do dia. Agora, com a mudança na legislação, foi estipulado este intervalo em 11 horas diárias e ininterruptas. O descanso semanal de 35 horas deve ser realizado após seis dias consecutivos de trabalho e não pode ser acumulado para ser aproveitado ao final de uma viagem. Durante o escoamento da safra, o trânsito de caminhões funciona dia e noite nas principais regiões produtoras do País. As recentes mudanças, segundo os legisladores, visam evitar acidentes e malefícios à saúde dos trabalhadores. Por isso, não será mais permitido o repouso dos motoristas com o veículo em movimento mesmo no sistema de revezamento durante a viagem, sendo necessário que o automóvel esteja estacionado para caracterizar o descanso. As mudanças podem trazer impactos na esfera judicial, social e econômica para o agronegócio. Neste caso abre-se um precedente para o ingresso de ações trabalhistas pleiteando direitos baseados agora na decisão do STF, o que pode ocasionar um passivo trabalhista para o setor de transporte. É importante destacar que os empregados e as empresas de transportes se ajustaram há mais de oito anos à nova legislação, inclusive tomando decisões e firmando contratos baseados no ordenamento jurídico vigente à época. Com as alterações recentes, as empresas terão uma oneração da folha de pagamento: estima-se um acréscimo de despesas trabalhistas entre 30% e 40%, além do incremento no custo com a logística, o que certamente impactará no custo do frete, comprometendo a saúde financeira das empresas. Isso poderá acarretar impactos no agronegócio pelo possível aumento no frete. Para cooperativas, tradings, entre outras empresas que comercializam e transportam grãos, é recomendado que a contratação de empresas ou profissionais terceirizados só será vantajosa se a contratante ficar atenta a detalhes que asseguram que o contrato não trará problemas futuros. Desta forma, o preço não pode ser único fator a definir uma contratação de um frete. A empresa contratante precisa escolher bem os profissionais ou a empresa terceirizada, a qual precisa ser qualificada e especializada. Quando o STF declarou que alguns artigos da lei são inconstitucionais, sua inconstitucionalidade é declarada desde a sua origem. A Lei dos Caminhoneiros, que foi publicada em 02 de março de 2015, de forma que os efeitos da decisão do STF devem ser estabelecidos, ou seja, se da data da decisão, 2023, ou se a inconstitucionalidade retroage à data da publicação da lei de 2015. De toda forma, não há dúvidas que os impactos financeiros e operacionais para o setor de transporte rodoviário são significativos. Vale-Pedágio Outra discussão que entrou em pauta e que também trará consequências para o agro é o Vale-Pedágio, que foi implementado no Brasil por meio da Lei nº 10.209/2001. Em 2021 (Lei 14.229/2021), tivemos uma alteração importante no que se refere ao prazo prescricional para cobrança da indenização eventualmente devida ao transportador. Assim, o prazo prescricional, que antes era de 10 (dez) anos, foi reduzido para 12 (doze) meses. De todo modo, mesmo com a redução do prazo prescricional, o valor desta indenização pode ser muito significativo, já que é calculado em quantia equivalente a duas vezes o valor de cada frete tido como irregular no período de um ano. Finalmente, recentemente veio a Resolução n.º 6.024 da ANTT, que regulamentou, dentre outros pontos, que o contratante do serviço deve antecipar o Vale-Pedágio por meio de uma fornecedora de Vale Pedágio Obrigatório (VPO) habilitada pela ANTT. Tivemos uma alteração importante no que se refere ao prazo de prescrição para cobrança da multa imposta ao embarcador que infringir o regramento do Vale-Pedágio, R$ 3 mil por veículo e por viagem, além da cobrança da indenização eventualmente devida ao transportador (no valor equivalente a duas vezes o valor do frete). Assim, o prazo de prescrição, que antes era de 10 anos, foi reduzido para 12 meses. Recentemente veio a Resolução n.º 6.024 da ANTT, que regulamenta, dentre outros pontos, que o contratante do serviço deve antecipar o Vale-Pedágio por meio de uma fornecedora de Vale Pedágio Obrigatório (VPO), habilitada pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). Com as devidas mudanças, cooperativas, tradings, e transportadoras de grãos precisam assegurar que seus contratos e práticas comerciais estejam adequadas à legislação vigente. A formalização de contratos e a execução de rotinas adequadas à atual realidade legal traz segurança jurídica ao contratante e é fundamental no caso de eventual demanda judicial. Para organizações do agronegócio, que ainda não estão de acordo com as novas diretrizes do Vale-Pedágio, é necessário conferir se a prática tem sido adotada de acordo com a legislação, o que inclui as regras da ANTT. Para fazer essa avaliação, bem como eventual adequação, é essencial a análise de todo fluxo operacional e dos contratos firmados com os prestadores de serviços. As empresas do agronegócio, que em regra utilizam prestadores de serviços via rodovias pedagiadas, precisam se adequar à legislação para evitar a aplicações de multas ou pagamento de indenizações.
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